terça-feira, 12 de maio de 2009

... das citações e notas

“...temo que, se alguém me ler... comece a colocar seriamente a questão de saber se não terei definitivamente enlouquecido. Talvez. Mas o meu propósito não era enviar notícias da minha atual saúde mental. Era explicar que ler, no verdadeiro sentido do termo, na acepção apaixonada que temos que lhe dar, só pode ser uma atividade desmedida, insensata, irracional, feita de rituais, cerimônias, gestos desatinados, cumplicidades incendiárias...
...resta o argumento pessoal, quase íntimo: sempre vivi entre as palavras... Pequeno exercício quotidiano: ler frases desgarradas, soltá-las arbitrariamente do texto. Isto é, abrir um livro ao acaso, num sinal vermelho, antes de o filme começar, durante os anúncios na televisão, e escolher à toa algumas palavras. Sempre pensei que, numa dessas frases, chegaria a verdade, o encontro decisivo. Uns jogam na loteria, outros nas palavras.”

Eduardo Coelho.
Tudo o que não escrevi. Diário, Lisboa. Ed. Asa. 1992.

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